Dois toques de corneta

"E eu sei que você sabe, quase sem querer, que eu quero o mesmo que você". Essa frase me pegou desprevenido. Quase que um soco no estômago; uma tontura. Isso porque, ontem à noite, descobri que não sei o que quero. E digo isso não de uma maneira ruim; digo porque sei como quero, mas não sei o que fazer para os devidos fins! Sei que quero o bem e o que é bom. Não quero causar danos; esse sou eu! E, nesse meio, me perco. Me perco, principalmente, em pensamentos. Meu maior perigo.

O Cointreau que agora tomo tem sabor de nostalgia. Seco, da garrafa empoeirada, esquecida no fundo do armário por um pai que não sente nele o mesmo que eu. Talvez porque, para eles, seja apenas uma bebida velha. Para mim, é algo mágico, feito e guardado cuidadosamente por tantos anos. Seu rótulo amarelado, manchado, seco e descascado, exerce sob meus olhos fascínio indescritível. E seu sabor; Ah!, seu sabor... Sabor de saudade, sim! Seco, doloroso. O líquido muito provavelmente é Cointreau há mais tempo do que eu sou Rafael. Seu sabor de memórias antigas, de recordações guardadas, de fotos cuidadosamente arranjadas em uma velha caixa de sapatos que é mantida sobre um velho armário num também velho quarto. São tantos devaneios!

Quero aquele abraço apertado e comprido outra vez. O aconchego do ombro. Mãos geladas, quem sabe?, às vezes vêm a calhar. A solidão de meu quarto, vazio, mesmo com dois viventes em seu interior, me inebria mais que qualquer droga. Mas não mais do que me inebriaria um abraço.
Aquele abraço.

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